Auauauauauauauauauauau acordei assim!

Acordei assim... Auauauauauau... ouuuauauauau....auuuuuuu..auuuauuuauuuauuu A cachorrada estava totalmente inquieta em minha rua. Fiquei tentando adivinhar o que haveria acontecido para que provocassem tanto, ou quem sabe já começassem os festejos de Santo Antônio... A manhã está fria, há uma cor acinzentada no ar, resolvo meditar... aquieto a mente que ainda se espreguiça internamente em seu despertar... Inspiro... Expiro... Respiro... Espirro... Inspiro... Espirro... Expiro... Espirro... E o atchim se instala não me deixando concentrar na paz da manhã que acorda me trazendo os primeiros raios de sol... Ouço os primeiros movimentos de minha filha que se arruma para a academia e começa então a sinfonia dos plact plect ploct... Por ser surda não existe nela nenhuma dimensão do barulho que provoca ao levantar... Muitas vezes levantei para explicar que precisava manusear as coisas com mais leveza... E sempre via sua carinha de surpresa a me perguntar: Faz barulho? Sim filha. Faz barulho por o prato na mesa, fechar e abrir geladeira, pegar a chaleira no paneleiro... Faz barulho abrir e fechar seu armário...  Difícil para ela praticar leveza na forma de tocar os objetos se não consegue dimensionar o som que todos eles trazem... Interessante perceber neste momento que a vida faz barulho e um grande barulho... Tudo que há emite som... Tudo que existe embora pareça morto tem vida... E fico ali entre um atchim e outro prestando atenção ao som que o liquidificador agora faz bhurumhumhummmm, o prato sendo posto em cima da mesa plac, a geladeira abrindo e fechando skummm - bummmm, a gaveta sendo aberta - rhummmmmmm - e o trilintar dos talheres dançando, posso até sentir a sua mão trilinnn trilinnn a procura do talher adequado... Ouço a elegância de uma mulher passar na rua no seu toc toc matinal... O pensamento voa para fora da janela... Vejo que os cachorros silenciaram... Os pássaros começam a cantar, na verdade com o silêncio dos cães agora posso os ouvir... Mas a atenção que havia voado pela janela atraída pelo som do salto alto volta agora à sala de casa ao som da cadeira sendo puxada reeeccccc, e o som da televisão a invadir todo o espaço nas primeiras horas da manhã. Observo que o repórter nos "deseja" BOM DIA de forma automatizada, pois se pensasse na profundidade do que diz, talvez desse prioridade de nos relatar tantas  coisas boas que acontece a todo momento a nossa volta... Todavia é uma enxurrada de desastres, mortes, é uma disseminação do medo... Agora há uma pequena pausa em sua voz, assim como a mudança do tom que começa a falar de Santo Antônio. Escuto alguém dizer da alegria que é auxiliar o pobre e ouço outra senhora fazendo festa por receber um simples e com certeza, ainda mais humilde cobertor... Posso distinguir pelo som da voz das mulheres citadas o orgulho de uma e a humildade da outra... Vejo o quanto pode traduzir e expor o nosso coração a nossa própria voz... Paro de espirrar... Agradeço ao Universo e a vida por me presentear com mais um dia... Levanto e vou ver Claudinha que já está pronta para ir à academia... Ela é extremamente disciplinada e tem uma vaidade que foi herdada de sua avó paterna... Falo mais uma vez que precisa pegar as coisas com jeito para não provocar tanto barulho... Ela como sempre faz aquela carinha como quem diz: afff que saco minha mãe! Sorrio e a abraço... ela sai levando o seu silêncio e também o seu barulho... Interessante perceber isso desta forma. Pois embora o seu mundo seja silencioso, justamente por isso ela provoca muito mais barulho que seus irmãos... E cada vez mais adentra em mim o que sempre digo: O seu silêncio me fez e faz ouvir o mundo! Observo neste instante que Aa vida já está acelerada lá fora e o som dos pássaros se mistura aos carros na vizinhança que partem para mais um dia, aos passos apressados dos vizinhos que vão para mais uma jornada... Olho para o relógio e vejo que já preciso me arrumar e vou agora me deliciar nas águas frias de meu chuveiro que muitas vezes deixo a imaginação gritar mais alto e fecho os olhos carnais para abrir os olhos mentais que tem o MAGNIFICO PODER de me fazer viajar... E lá vou eu me banhar nas águas geladas das cachoeiras que há na minha maravilhosa Chapada...